É a cena mais comum que existe. “Cara, deixa eu te mostrar o novo CD que eu comprei! Conhece a banda xxx?”, diz seu amigo, todo empolgado, falando de uma banda que você nem imaginava que existisse.
“Que som massa, os caras são muito loucos!” “Olha essa música aqui!” E você lá: “legal…” Também, temos que ser educados, não é? Aí, no dia em que você quer mostrar aquela música que você nunca enjoa de ouvir, parece que ele não está nem aí. Você quer que ele conheça o artista que você curte, igual ele fez no outro dia, mas parece que ele só quer falar dos assuntos dele.
Dizer que “cada um tem seu gosto” é infantil. Todo mundo sabe (?) disso. Todo mundo diz isso a toda hora.
Daí vem o cara que tem mil CDs e vinis com músicas eruditas: sinfonias, sonatas, fugas, tocatas, concertos de tudo que é tipo, de compositores que deixaram suas marcas nos séculos, como Mozart e Beethoven, interpretadas por orquestras européias e grandes tenores e sopranos, e diz que a música popular é um lixo e está cada vez pior.
Depois vem aquele senhor que cresceu ouvindo bossa nova e diz que o Renato Russo não tem nada de especial.
Tem o metaleiro que diz que o rock está morto.
Aquela mãe conservadora que acha o rap um absurdo.
Aquela estudante de cursinho em cuja roda cult só se fala em MPB, tem que esconder que curte a Avril Lavigne.
Depois EU venho, declarando para os quatro cantos que não há uma canção sequer de pagode, axé, sertanejo e funk carioca que me agrade. (1)
Depois vem alguém da minha família dizendo que eu sou bitolado
Ou seja, poucos reconhecem de verdade que gosto é igual ao dedão do pé esquerdo, ou seja, cada um tem o seu.
Que a música que provoca impacto em mim não vai provocar o mesmo impacto no meu amigo. Na verdade, a música é uma das coisas mais pessoais que existem.
Pior ainda, eu que não reconheço que estou virando um chato a dar lições de moral. Cadê aquele meu humor ácido, crítico? Pronto, tomei minha dose de Escrachaprina 1780mg, logo vai fazer efeito. Até a próxima!
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(1) Se gosto é gosto, os ouvintes dessas músicas têm todo o direito de tirar delas o prazer que eu tiro das bandas de rock antigas, da música clássica e das baladas pop que marcaram época. Só sinto um certo pesar por achar que eles perdem muito não apreciando a beleza elaborada dessas músicas, em favor de outras de assimilação mais fácil — mas vai saber se eles não sentem algo parecido em relação a mim…
(2) Aquele sujeito no último retrato, com a guita na mão. O cara toca e compõe muuuuuuito! Na próxima encarnação eu vou ser como ele, prometo.
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